UTSM
Crónica de corrida
0
Nocturno
A noite acabou antes de ter começado. Ainda mais de uma hora faltava para a verificação de material e já o aquecimento cerebral de alguns os fazia revolverem-se, de tal modo que, pouco passava das 2 horas da manhã, também nós nos resolvemos remover do nosso solo duro. Já equipados, transpusemos a câmara de chamada e juntámo-nos à pequena multidão reunida na pista do estádio. Temperatura amena, um grau considerável de humidade e um colectivo de boa disposição. Quatro horas em ponto e começa-se a escoar o pelotão em formação ordenada rumo à primeira subida até ao Reguengo. Pelos caminhos ouvem-se vacas, não as vemos, mas sentimos-lhe a proximidade e num cruzamento, cerca da 4h 25m, há a surpresa de ver público a aplaudir e incentivar o comboio de corredores.
1
Luzes na Noite
Sempre a subir, já transposta uma linha de água e com um chuvisco constante a acompanhar-nos, só os focos dos frontais cortavam a escuridão circundante, fazendo-nos ver as fitas orientadoras, que nos levaram até ao PAC1 (Posto de Abastecimento e Controlo), no Viveiro, apenas um clarão de passagem para nova entrada na noite escura.
2
Alegria Breve
Sempre a descer, aos 17Km e 500m de altitude, entramos em Alegrete, que fazendo jus ao nome, num ambiente feérico, com o PAC 2 instalado no coreto, transbordava de alegria. Registo, segue e siga.
3
Cume
Enquanto a aurora ia despontando corríamos em direcção ao pico altimétrico da prova: cerca de 1000m e 30km. Paragem momentânea e nova descida.
4
Vale
Percurso de cerca de 10km, rápido, duro e difícil, nalguns pontos, aquilo que no jargão do trail se designa por descida técnica, até à Apartadura, PAC4 instalado junto à barragem, com chouriços a serem preparados, para quem se sentisse necessitado de proteína animal, perto do Km38.
5
S.D.S
Sobe, desce, sobe, em caminhos até acabar nuns metros de estrada, com paragem à esquerda e uma pequena paragem no PAC5, em Porto da Espada, estávamos quase na metade, andados que tinham sido perto de 48km. Cola, laranjas, bolachas, bananas, água, nada é demais para continuar a (per)correr caminho.
6
Marvão
Até Marvão iam ser só 10km, de sol e solo e, pensava-se, cerca de 6km de subida contínua. Quase, quase a chegar lá… Sísifo olha-nos, nós olhamos para o GPS e estamos quase no Km60, quando transpomos a porta (pequena) de Marvão. Uma corrida até ao pasto, em ritmo de cabreada. PAC6, sopa quente, muda de água, tostas e ala que se pode fazer tarde.
7
Calçada, Calçado/Descalço
Saídos de Marvão entramos numa estrada de pedraria descendente que nos faz pensar que se calhar enganamo-nos e temos calçado um daqueles excelentes modelos minimalistas, que nos fazem sentir ao natural toda a beleza da natureza, aculturada pelo Homem, debaixo dos nossos pés. Entrada na estrada para Castelo de Vide e desvio à esquerda, por terra batida, sempre a subir e com troço breve de estrada até à entrada de Carreiras, lugar do PAC7, com cerca de 69Km trilhados. Abastecimento reforçado, à medida que os Kms e o tempo avançam, o consumo torna-se mais rápido, por isso, além da necessidade há que estar constantemente a reforçar e prevenir. Nova descida em direcção a Castelo de Vide. Teoricamente só faltam 7km para lá chegar…
8
“Longe fica o caminho”
Longa e suave subida, lajeada, até quase à Senhora da Penha, quase, porque o caminho mais directo foi evitado, circundando-se o cabeço onde se situa a capela. Novo abastecimento, PAC8, 74Km, regulamentares… Nova partida, nova viagem.
9
Meia maratona e pouco mais
Digestão do abastecimento estrada abaixo, inflexão à esquerda por caminho, que levam a subir pelo meio de mato e folhedos, onde abundam árvores retorcidas e dilaceradas e a andar por estradões que parecem levar a sítio nenhum. E o último PAC que nunca mais chega. Um abastecimento longe demais…que por fim aparece, ao km88. Sente-se já o frio do crepúsculo e na última subida, Cabeço do Mouro, volta o frontal, que há-de ser uma companhia constante a par do intermitente acompanhamento dos bastões até ao final deste Grande UTSM.
Epílogo
No total estima-se em 105Km a totalidade deste Grande UTSM, onde deve ser feito um sentido elogio à sua grande organização e à forte relação que os seus membros estabeleceram com os participantes.
A terminar, provas deste género permitem visões diferentes do habitual, um assunto que foi, aliás, debatido com o Presidente do CAAPP.